O cheiro era o que primeiro vinha, cheiro de tinta fresca se misturava com o dos cigarros antes mesmo de abrir a porta. A porta que rangia sempre e travava no taco solto logo em frente, deixando um espaço de pouco mais de trinta centímetros para o visitante entrar. Não que alguém entrasse ali. O sol iluminava através dos buracos na cortina permitindo que ficassem visíveis as manchas de tinta no chão próximo ao cavalete, onde um gato velho e magro dormitava tranquilamente.
Próxima da janela havia uma mesa com uma das pernas quebradas mantida em pé por uma pilha de livros texto de diferentes religiões. Se prestasse um pouco mais de atenção veria uma bíblia do século XV e a primeira versão européia e ilustrada do Kama Sutra, apenas dois bancos de fórmica a guarneciam enquanto o vapor do café se elevava sinuosamente para a luminária sem lâmpada.
Ao lado da porta, onde você ainda deve estar, há uma escrivaninha recoberta de papéis escritos e amarrotados encobrindo o laptop enquanto na parede diversos cronogramas, pôsteres e folhetos pareciam prestes a desabar. Debruçado sobre tudo isso se achava o dono do quarto enquanto noutro canto sua cama restava desarrumada e ocupada por ninguém. Os livros estavam por toda parte. Em estantes, arrumados em pilhas pelo chão, equilibrados precariamente em cima do som, espremidos em vasos de plantas e até mesmo pendurados como se para secar no varal.
LoucurA & LucideZ 